Estudo
aponta a ineficácia da vegetação exótica
para a conservação da biodiversidade
Mudanças propostas para o
Código Florestal quanto à recuperação
de áreas degradadas da reserva legal colocam em risco a
manutenção de serviços ambientais essenciais
para a sociedade e os sistemas produtivos
Brasília, 30 de outubro de 2007 –
A contribuição do plantio de espécies exóticas
visando à restauração de ecossistemas naturais
nos biomas brasileiros para compor as áreas de reserva
legal é praticamente nula para a conservação
da biodiversidade. Essa é a conclusão de um estudo
realizado por cientistas da Conservação Internacional
(CI-Brasil) compilado na 5ª edição da revista
eletrônica Política Ambiental. Em “Áreas
recuperadas com vegetação exótica contribuem
para a conservação da biodiversidade?”, os
pesquisadores avaliam uma série de trabalhos que mostram
a incapacidade das culturas de plantas exóticas em proteger
a biodiversidade.
A motivação da análise foi uma recente proposta
de alteração do Código Florestal brasileiro
que objetiva permitir, a proprietários rurais que não
têm em suas terras a reserva legal exigida por lei, o uso
de espécies exóticas para a recuperação
de áreas degradadas. Reserva legal é um instrumento
incluído na legislação ambiental brasileira
que diz que parte da propriedade rural não pode ser desmatada
e dever ser mantida para proteção da vegetação
nativa e, consequentemente, da biodiversidade. O Código
Florestal (Lei 4.771/65) define o tamanho da área de reserva
legal conforme a região onde a propriedade se localiza.
Função social – De acordo
com a constituição brasileira, toda propriedade
rural no país tem que cumprir sua função
social, destaca Ricardo Machado, diretor do programa Cerrado Pantanal
da CI-Brasil e um dos autores do estudo. Ele lembra que isso acontece
a partir de um conjunto de fatores, que vão desde o aproveitamento
racional da propriedade e o respeito às relações
de trabalho visando ao bem-estar humano até a utilização
correta dos recursos naturais disponíveis e a preservação
do meio ambiente. “A reserva legal é uma forma de
garantir a sustentabilidade econômica, social e ambiental
da propriedade. Assim, a idéia é usar menos a terra
para poder usá-la sempre”, explica.
A preservação ambiental nas propriedades rurais
também é preconizada na Lei de Política Agrária,
que em vários artigos menciona a necessidade de proteção
do meio ambiente e recuperação ambiental de áreas
degradadas. Para Machado, a proposta de mudança no Código
Florestal, que possibilitaria ao dono de uma propriedade rural
com passivo ambiental lançar mão do plantio de espécies
exóticas para a recuperação da área,
vem dificultar que aspectos essenciais da função
social da propriedade sejam cumpridos. “A experiência
mostra que áreas com exóticas pouco contribuem para
a manutenção da biodiversidade. Isso só faz
sentido se o objetivo é recuperar áreas degradadas
com finalidade puramente econômica”.
Literatura nacional e global – Ao longo
do ensaio, os autores citam estudos que avaliaram a riqueza de
espécies da fauna nativa comparando diferentes ambientes,
segundo a presença ou ausência de vegetação
exótica. Em 1996, um trabalho sobre a ocorrência
de aves na região do rio Doce em Minas Gerais em remanescentes
nativos, eucaliptais com sub-bosque nativo e eucaliptais limpos
revelou que poucas espécies da fauna nativa conseguem sobreviver
em monoculturas de eucalipto. Segundo o estudo, espécies
mais exigentes e geralmente consideradas indicadoras da qualidade
ambiental desaparecem dessas áreas, onde a perda de espécies
chega a 67%. Dois anos depois, estudo semelhante no Parque Estadual
do Rio Doce apontou que apenas 22 das 149 espécies de insetos
e aranhas presentes na mata nativa sobrevivem nos eucaliptais.
No Cerrado, pesquisa realizada em 2000 comparando o número
de espécies de aves no cerrado nativo e em áreas
de pastagens mostrou que 78% das espécies não ocorrem
nos ambientes artificiais, que também registraram apenas
três das 10 espécies endêmicas. Estudos em
plantios de cacau na Indonésia e no sul da Bahia indicam
que a perda da biodiversidade nos cultivos – incluindo os
sistemas agroflorestais – é significativa, com uma
redução de cerca de 60% das plantas nativas. “Uma
menor riqueza de espécies em ambientes artificiais pode
ser responsável por uma maior incidência de pragas,
pois as populações de predadores também são
reduzidas”, alerta Machado. “Espécies que sobrevivem
em monoculturas sem serem controladas pelos predadores naturais
podem acarretar sérios prejuízos econômicos”.
Sustentabilidade ambiental – Os autores
do estudo chamam a atenção para o fato de que a
mudança proposta no Código Florestal não
irá resolver o principal problema da agropecuária
brasileira: a insustentabilidade ambiental. “O Código
Florestal é uma legislação completa e moderna.
Sabemos que ele ainda não é cumprido em muitas partes
do país, mas não por isso devemos afrouxar a lei
e ceder aos interesses puramente ruralistas, da produção
a qualquer custo”, esclarece Paulo Gustavo do Prado Pereira,
diretor de Política Ambiental da Conservação
Internacional e também autor do estudo. Para ele, a reserva
legal cumpre os objetivos definidos na legislação
brasileira quando é totalmente composta por ecossistemas
originais. “Sem fiscalização e monitoramento,
entretanto, a propriedade deixa de cumprir sua função
social e não garante o desenvolvimento sustentável
brasileiro. Para o melhor cumprimento da lei, o poder público
tem que aprimorar esses processos e identificar mecanismos financeiros
que estimulem o proprietário a enquadrar-se na lei, como
por exemplo, via pagamento pelos serviços ambientais prestados
à sociedade por meio da reserva legal”.
Para ver o texto na íntegra, acesse http://www.conservacao.org/publicacoes/index.php?t=5
Fontes:
Ricardo Machado – Diretor
do Programa Cerrado-Pantanal da CI-Brasil
Contatos: (61) 3226.2491 / (31) 9296.8559 – r.machado@conservacao.org
Paulo Gustavo do Prado Pereira – Diretor
de Política Ambiental da CI-Brasil
Contatos: (61) 3226.2491 / (31) 9296.8554 – p.prado@conservacao.org
José Maria Cardoso Silva – Vice-Presidente
de Ciência da CI-Brasil
Contatos: (91) 3225-3848 – j.silva@conservacao.org
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